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Rui Portulez trabalha como A&R na NorteSul, editora de Valentim de Carvalho. É autor de vários documentários sobre a cena musical portuguesa independente (“I love my label” na Antena 3 e “Uma espécie de punk” na Antena3 / RTP 2). Trabalhou como radialista (RUC, XFM, Oxigénio) e como jornalista de música no Público, entre outras coisas. Todos os dias ouve Gil Scott-Heron, John Coltrane, LCD Soundsystem, Moodymann, Sleaford Mods, NxWorries, Ermo, Pega Monstro e Bruno Pernadas.

TEXTO DE RUI PORTULEZ

… É NOSSO!

Apetece logo de rajada perguntar De quem é o carvalhal?*, e acrescentar caralho!!!, coisa que o José Mário Branco nunca diria mas que se intuía no despejar da raiva do FMI (e na carta que escreveu ao Sr. Silva), no operacionalizar da impotência em vontade de mudança, na catarse transformada em inspiração, na instauração da sensação de pertença partilhada, no arregaçar das mangas… Como se tudo se reunisse num sonoro “Vamos a isto, camaradas”, seguindo o exemplo de integridade, ética, responsabilidade e assunção das consequências, no que se diz e no que se faz, daquele tipo seco, teso, de bigode em riste, riso traquina nos olhos e chispas na língua, tão capaz de lançar a palavra mais dura como a chalaça mais coloquial. Né, filho?*

É assim que se deve ser um artista de corpo inteiro, um criador, alguém que persegue uma utopia, a sua utopia, e luta por ela, e tenta convencer quem o rodeia de que vale a pena, nunca tornar a alma mais pequena. A ideia é exactamente a contrária, fazer-nos crescer, a todos. Procurar o bem comum e sim, porque sim, um mundo melhor. É preciso sonhar e criar. Em liberdade. Sem censura, sem ingerência. Desopila-me o fígado, pá!*

E é por isso sempre tão imediata a ligação, que vem de longe, de muito longe, do Zé Mário ao 25 de Abril, ainda que a festa dele, o seu sonho lindo, não se tenha cumprido. Mas não foi por isso que deixou de perseguir os seus ideais na música, nas letras, na cidadania. Um caminho longo, uma viagem comprida feita de inquietação e interrogação, de procura e crítica, de abertura ao mundo, da música, do pensamento e das pessoas. Foi isto que o José Mário Branco sempre fez, disse e cumpriu, trocando as voltas a um mundo composto de mudança. Sem facilitar, independentemente do género, do fado à pop-chula, da marcha popular à música mais erudita, em nome próprio, no festival da canção ou para quem quer que fosse, nos poemas que fazia e nos poemas que escolhia, porque também a forma faz sentido. A forma como se fazem as coisas, mas também as fronteiras e margens que enformam a criação, e que convidam à transgressão, ao arrepio, à reinvenção, à diferença.

A obra do José Mário Branco é imensa e inesgotável, e continuamente renovada, por toda esta complexidade de elaboração, pela atenção ao pormenor, por uma exigência constante e uma vontade de explorar, avançar, rasgar novos espaços de invenção, tanto em termos de elementos e soluções musicais como em termos líricos, de sentido e sonoridade das palavras, num diálogo musical constante com as suas referências e os ouvintes, que por sua vez tomam a obra como sua e a medeiam, passando-a de boca a ouvido… E quando os ouvintes são músicos (oiça-se a colectânea “Um disco para José Mário Branco”, uma amostra incontornável de exercícios de releitura e citação feita por um naipe de artistas que vai dos Ermo a Mão Morta, dos Walkabouts a Camané, ) é fácil de perceber que este efeito multiplicador, exponencial, transversal e transgeracional, existe e vai por certo perdurar. É desta massa que os sonhos são feitos e as utopias também…

Há quem cante por interesse, há quem cante por cantar, há quem faça profissão de combater a cantar. E há quem cante de pantufas para não perder o lugar. A cantiga só é arma quando a luta acompanhar… (GAC – A Cantiga é uma Arma)

E fez mais às vezes uma só canção do que muita panfletada. (Zeca (Carta a José Afonso))

* FMI (FIM)

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