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MUSICBOX

Conversámos com Trypas Corassão, o projecto hibrido de Cigarra e Tita Maravilha. Entre a performance e o concerto, nasceram as primeiras ideias para “Beleza como Vingança”, o primeiro disco da dupla que foi lançado pela portuguesa Naive e pela brasileira Mamba Recs. Vão estar hoje (8 de Julho) na Musicbox com Teto Preto e R Vincenzo.

A Mamba Negra é ícone da resistência LGBTQIA+ em SP. Vocês conseguem explicar o fenómeno para quem é de Portugal?

Cigarra – O convite veio. Foi alto convite. (risos) Quando estávamos a planear este álbum, também estávamos a pensar onde é que o iriamos lançar. Procurávamos alguém com uma estética a ver com a gente, tanto aqui como no Brasil, porque também queríamos fazer esta ligação. Mostrar que ela existe. Então, quando escolhemos a Naive aqui, uma editora que conversa conosco de várias maneiras: com a Rádio Quântica, o Planeta Manas, todo o trabalho da Violet está relacionado com o meu há algum tempo, e o trabalho da Naive tem cada vez mais a ver conosco. Para além disso, a editora é ligada à Mamba.

Fotografia por Ana Viotti

Eu estava no início deste desenvolvimento todo, em São Paulo, com o Voodoohop, e com outras revoluções que estávamos a fazer na cidade naquela época. Há uns 15 anos. A Mamba Negra aparece desta história. Toda esta gente cresceu junto comigo, já há muitos anos. E quando pensámos que ligação que queríamos ter em São Paulo, fez bastante sentido para nós. A Mamba Negra aparece de uma necessidade da cidade de criar novos espaços, novas estruturas, novas formas de fazer festa, que misturasse tanto uma potência de um publico forte da música eletrónica, mas que também trouxesse outras representatividades. É uma festa que traz um público queer, e que está pensando urgências na cidade. E, sim, é uma referência já mundial. A nossa ligação é mais com a editora Mamba Rec, mas hoje vamos celebrar com eles, junto com Teto Preto, que tem tudo a ver com a nossa resistência, e com R Vincenzo que também desenvolveu tudo conosco desde sempre lá.

Falando desta ligação entre São Paulo e Lisboa, vocês sentem que há muita diferença entre os públicos destas duas cidades?

Cigarra: Ah, completamente. De São Paulo ou de qualquer outra cidade brasileira. Eu posso falar mais de São Paulo, a Tita pode falar mais do circuito de Brasília. E aqui nós estamos a formar uma coisa nova, então as referências de Trypas Corassão são chamadas de três pontos. O que formamos aqui é um público dissidente de vários lugares. É tão interessante que a potência aqui não vem de uma relação direta com construção da cidade, que é um pouco o que a gente vive lá no Brasil. O que desenvolvemos dentro da cidade para fora. Aqui parece que é uma coisa que fazemos de fora para dentro e aí a cidade desenvolve-se a partir disso. Aqui a nossa ligação, o nosso público, a nossa rede, ela é formada de gente não é só do Brasil todo, também da América Latina, Europa. A gente liga-se aqui, criando uma nova realidade quase paralela mas muito relacionada com a história de Lisboa.

Tita: Eu penso sempre na ideia de formação de público. Quem são as pessoas que vão estando com a gente durante o processo, desde o momento que criamos coisas em Lisboa. É importante ressalvar que esse encontro se dá em Lisboa. O nosso público também vai refletindo essas nuances, que são várias. Pessoas que estão deslocadas, mas também essa comunicação com as pessoas daqui e que estão disponíveis para se emocionar com a gente, para conciliar essas histórias, para questionar algumas coisas do passado também. Está todo o mundo junto nesta pista. Eu acho que é muito importante pensar nestas pessoas que voltam, que acompanham o trabalho, que vão descobrindo como é descobrir. Essa coisa fica intermédio. Eu acho que este álbum e e o que a gente faz é muito pensado a partir das pessoas que vivem e que vibram, a partir do Brasil e de Portugal, como abrir essas fronteiras.

Fotografia por Ana Viotti

“Beleza como Vingança”, para além de um disco com um nome perfeito, parece que é muito construído em trabalho com outras pessoas também. É esta a forma como gostam de abordar a composição? Abrir a porta para outras pessoas?

Cigarra:  Sim, eu acho que na verdade é impossível fazer ao contrário na nossa relação. Não é um trabalho solitário, não é uma criação solitária. Além de ter muitas referências que para nós são muito fortes, quisemos trazer o máximo de presenças no projecto como um todo. E principalmente ali em algumas vozes que achávamos muito importantes. Nós queríamos muito mais mas foi aquilo que nós conseguimos fazer à distância.

Tita Maravilha: Temos 3 colaborações na produção (R Vincenzo, Mandacaru e Vinícius BigJohn) e temos 3 vozes. Essas vozes surgiram também na necessidade de ampliar a não representatividade de uma pessoa só porque acho que este álbum se torna um grito assim. Estas pessoas foram convites muito especiais para nós. Na nossa música “Fast Furious” propomos à ENANA, que ficou um mês fazendo uma Roda de Sample. Surgiu um improviso de cruzamento de vozes maravilhoso. ENANA é uma pessoa que canta também em Árabe e inglês, então já tem esta fusão. Depois chamámos 2 pessoas trans latino-americanas. Uma amiga minha de Brasília que é a Iêda, e a Lola Bhajan, para acrescentar estas vozes que gritam uma América Latina pulsante. Fazer esta coisa ampliar territorialmente também. 

Um disco é um trabalho muito concentrado que depois quando parte para um concerto ou uma performance acaba por ter outra vida. Como é que é esta adaptação para este registo diferente?

Ágata: Na verdade foi mais ao contrário. Foi um desafio maior transformar o espetáculo num álbum. Isso é que foi novidade para nós. Descobrir como o formatar, porque nos nossos concertos tínhamos recortes narrativos mas também muita improvisação livre e uma maior repetição, uma hipnose na música. Tivemos de pensar como é que adaptávamos isto para estas músicas, como separar as coisas. E o desafio mais este. Agora uma vez que as músicas já estão feitas, voltar para esta narrativa de palco é só tentar retomar a experiência que tínhamos de uma música mais livre também no meios destes recortes todos. Estamos a descobrir ainda, ainda é uma experiência.

Tita: E hoje vai ser um desafio nesse sentido porque é o re-formato. Hoje já vamos fazer uma brincadeirinha mais gostosa também que é, nesta produção tivemos estes instrumentos que geraram esta música. Hoje vamos experimentar ao vivo com estes instrumentos, uma ideia de Trypas Corassão banda. Vai ser chiquérrimo. (risos) É outra potência.

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